Olá, leitor do Fato 360! Recentemente, decisões do STF ganharam destaque, quando o Tribunal cassou decisões que reconheciam vínculo empregatício entre profissionais liberais (médica e advogada) e seus contratantes (hospital e escritório de advocacia).
Foi nesse cenário que o termo “pejotização” voltou aos noticiários, e você deve ter ouvido, mas talvez não saiba, exatamente, do que se trata, certo?
Primeiramente, entendo essencial esclarecer que, em nosso ordenamento jurídico, relação de trabalho e relação de emprego não são a mesma coisa. A relação de emprego é caracterizada quando uma pessoa física presta serviços remunerados a outra pessoa (física ou jurídica), de forma não eventual, mediante salário e com subordinação. A relação de trabalho, por sua vez, é mais ampla e comporta, além da relação de emprego, outras formas de contratação, como o serviço eventual, contratos de parceria, trabalho autônomo, entre outros.
É importante conceituar a forma de contratação conhecida como terceirização, que é quando uma pessoa jurídica contratante firma contrato com outra pessoa jurídica para que esta preste serviços em seu favor.
Evidente que em se tratando de relações humanas há sempre aqueles que burlam as regras, independentemente de onde elas estejam previstas – se na CLT, no Código Civil ou mesmo na Constituição Federal. E é pelo descumprimento das regras da terceirização que surgiu a “pejotização”, termo assim denominado para demonstrar a criação de uma pessoa jurídica com o intuito de “mascarar” uma relação de emprego.
Ou seja: apesar de a prestação dos serviços ocorrer nos moldes de um vínculo empregatício, a contratação entre as partes se dá por intermédio da constituição de uma pessoa jurídica e tal prática pode ser considerada nula, verificado o intuito de fraudar as características reais da relação, que deveria estar sujeita ao regime da CLT.
Importante destacar ainda que, apesar de o termo ser relacionado ao cometimento de ilícito, o STF vem utilizando o termo “pejotização” não mais de forma pejorativa, mas simplesmente para se referir à prestação de serviços por pessoa jurídica dentro das possibilidades legalmente previstas, desde que reflita a realidade da relação, quando o contratado não esteja subordinado ao contratante.
O entendimento do STF é pela possibilidade de adoção de diversas formas de organização e divisão de trabalho, entre elas a constituição de pessoas jurídicas para prestar serviços terceirizados, inclusive nas atividades principais da empresa contratante, baseado, especialmente, no direito constitucional do livre exercício da atividade econômica, o que significa, a meu ver, um excelente posicionamento da Suprema Corte, pois prioriza a liberdade organizacional dos empreendedores, que não ficam obrigados a aderirem um único modo de contratação imposto pelo Estado, e bem mais oneroso para ambas as partes, diga-se de passagem.
A liberdade para adoção de outras formas de contratação é vantajosa não apenas para o contratante, pois o prestador, não raras vezes, experimenta vantagens tributárias com a menor incidência de impostos sobre seus ganhos, o que representa uma remuneração líquida maior que a que receberia se contratado pelo regime previsto na CLT.
Especialmente por tais vantagens, que a terceirização é amplamente adotada por profissionais liberais, como médicos, advogados e engenheiros, por exemplo, que constituem pessoas jurídicas para firmarem contratos com hospitais, clínicas, escritórios, construtoras, etc, e assim optam pelo regime jurídico-tributário que entendem mais vantajoso, o que deve ser respeitado, desde que não configure uma tentativa de fraude aos direitos daqueles que, comportando-se com verdadeiros empregados, são coagidos a constituir uma pessoa jurídica como condição para a prestação de serviços.
Inexistindo a tentativa de simular a relação real mantida entre as partes, não deve a prestação de serviços por pessoa jurídica ser considerada errada ou prejudicial, como muitos podem concluir, pois traz benefícios imediatos aos que adotam tal regime, devendo prevalecer a manifestação da vontade das partes envolvidas em detrimento da excessiva intervenção estatal nas relações privadas.
Driely Atem é Advogada, sócia do Escritório Souza e Atem – Advocacia Empresarial.E-mail: contato@souzaeatem.adv.br Instagram: @souzaeatem
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