Kahlil Gibran foi um escritor, filósofo, pintor e poeta libanês, que se destacou por sua habilidade em misturar misticismo oriental com espiritualidade ocidental. Ainda jovem, Gibran e sua família emigraram para os Estados Unidos, onde desenvolveu sua obra literária em inglês. Seu estilo único o coloca como um verdadeiro apóstolo da palavra, combinando parábolas e metáforas simples, mas profundamente impactantes. Durante sua vida escreveu e publicou vários livros, dentre eles O Profeta.
Publicado em 1923, O Profeta é uma coleção de ensinamentos em torno do personagem Almustafá, um profeta que, prestes a embarcar para sua terra natal após 12 anos de exílio, responde às perguntas dos habitantes da cidade de Orphalese. Cada pergunta aborda um aspecto essencial da vida, como amor, casamento, filhos, trabalho, liberdade, dor e morte.
Gibran constrói seus ensinamentos como parábolas, oferecendo sabedoria de forma acessível e simbólica. Sua linguagem é simples, mas densa em significado, convidando o leitor a refletir sobre os mistérios da vida e sua própria jornada espiritual.
Sobre o amor, Gibran descreve-o como uma força transformadora e, muitas vezes, dolorosa: “Quando o amor vos chamar, segui-o, ainda que seus caminhos sejam árduos e íngremes.” Gibran não romantiza o amor como algo sempre suave e prazeroso, mas o apresenta como um mestre que molda a alma. Para Gibran, amar é aceitar o sofrimento como parte do crescimento pessoal. Essa visão desmistifica o amor e o coloca como um caminho de autoconhecimento e transcendência.
Ao abordar o casamento, Gibran defende a união, mas sem a anulação da individualidade. Ele afirma: “Dai um ao outro de vosso pão, mas não comais do mesmo pedaço. Cantai e dançai juntos, mas deixai cada um estar só.” Esse ensinamento é uma lição valiosa para o equilíbrio entre o “eu” e o “nós”. Em um mundo que muitas vezes idealiza relações de dependência, Gibran lembra que o verdadeiro amor permite liberdade e crescimento mútuo.
Mas, a melhor parte do livro é o trecho em que Gibran oferece uma visão revolucionária sobre a paternidade:
“Vossos filhos não são vossos filhos. São os filhos e as filhas da ânsia da Vida por si mesma.” Ele enfatiza que os pais são guias e não proprietários. Essa perspectiva continua ecoando nos dias atuais, em um mundo que busca compreender o papel da educação e da liberdade individual. Continua: “Podereis tentar ser como eles, mas não tenteis torná-los como vós. Pois a vida não anda para trás nem se detém no ontem. Vós sois os arcos de onde os vossos filhos, quais flechas vivas, serão lançados. O arqueiro vê o sinal no caminho do infinito e Ele com o Seu poder faz com que as Suas flechas partam rápidas e cheguem longe”. Definição perfeita de como agimos com nossos filhos e de como queremos moldar nossos filhos à nossa vontade, mas nossos filhos possuem vontade própria e: “Suas almas habitam a mansão do amanhã, que vós não podereis visitar, nem em sonhos”.
No capítulo sobre dar, Gibran ensina que o verdadeiro ato de generosidade vem do coração:
“Dais pouco quando dais de vossas posses. É quando dais de vós mesmos que realmente dais.” Essa visão sublinha a importância de oferecer com autenticidade, um ensinamento que transcende o materialismo predominante em muitas sociedades modernas.
O livro segue com ensinamentos sobre as dúvidas dos habitantes da ilha de Orphalese: O comer, o trabalho, a alegria e a tristeza, sobre as moradas, sobre as roupas que usamos e várias outras.
O Profeta é uma obra que foi gerada entre a tradição do Oriente Médio e a vida agitada das grandes metrópoles da América, mas ainda assim transcende barreiras culturais e religiosas, oferecendo sabedoria universal para os dilemas da vida. Com um tom estoico e quase sagrado, Kahlil Gibran entrega uma mensagem simples, mas profunda, que inspira a transformação interior. Sua linguagem poética é capaz de alcançar leitores de diferentes contextos, tornando-se um convite à introspecção e à busca por uma vida mais significativa.
Em tempos hedonistas e utilitários como os que vivemos a obra é um sopro de virtude e a influência de Gibran é sentida em autores modernos, como Paulo Coelho, que revisita a espiritualidade e simplicidade em obras como O Alquimista.
Paulo Albuquerque – Formado em Tecnologia Florestal, instrutor de informática e conectado em Literatura, Sci-Fi e Cultura Pop.