O perigo da oração

26/10/2025 as 10:35 am

Rezar, nem sempre é uma atividade tranquila e consolante. Aliás, às vezes pode ser extremamente perigosa. Porque? Toda vez que nos colocamos perante a Deus, nos expomos à luz da verdade, que não pode esconder as dobras mais obscuras do nosso interior. Rezar, então requer coragem. A coragem de reconhecer uma realidade cruel. Por isso muitos se recusam de se colocar perante a Deus. De fato, toda vez que você reza de verdade, não pode trapacear, não é mais possível enganar a ti mesmo. A luz da verdade mexe com tua aparente tranquilidade e te obriga a dizer: “Pai, tem piedade de mim, pois sou pecador”. Porém há quem reza tentando iludir a si próprio, como o publicano na parábola de Jesus em Lucas 18,9-14.

Mas como pode acontecer isso? Acontece quando, descaradamente, não renunciamos a nos elogiar. Esta forma de oração é a mais perigosa, pois o Deus a quem nos dirigimos nada mais é que uma projeção do próprio ‘eu’. Certos crentes devotos, sem perceber, são na verdade verdadeiros ateus e são o contra-testemunho da fé, que tanto prejudica a Igreja. Basta pouco para entender que esta presunção do fariseu se sustenta na mentira. Ao dizer: não sou adúltero, você tem certeza que ama de verdade sua esposa? Ao dizer: eu não sou desonesto, porque se compara sempre com alguém pior que você? A parábola de Jesus nos diz que quem é exemplo de oração é o publicano, que, ao que parece, era desprezado por todos. Ele não julga ninguém. Não procura desculpas para se defender da luz da verdade perante a Deus. Se apresenta desarmado, ciente da própria indignidade, mas também confiante na bondade do Pai.

Quando nas nossas igrejas conseguiremos rezar com essa sinceridade e intensidade? Precisaríamos parar de imitar o fariseu hipócrita, desprezando os outros, aqueles que não estão conosco e não são como nós. Precisaríamos também ter um poco de lucidez espiritual, para acharmos graça de todas as nossas presunções e seguranças. Enfim, deveríamos idealmente sair do nosso lugar para nos colocar atrás do publicano e sussurrar com ele: “Senhor de bondade, tenha piedade de todos nós e dai-nos o dom de nos amar!”. Alguém poderia dizer que, dessa forma, estaríamos modificando a parábola de Jesus. De fato: é isso mesmo que o Senhor está querendo de nós.

Padre Daniel Curnis – Pároco da Paróquia Nossa Senhora de Nazaré, em Manaus

Foto: reprodução/Arquidiocese de Manaus

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