Fui a um velório e este era diferente. Primeiramente, o local era uma casa, no meio da sala. Não sei quanto a vocês, mas sempre que compareci a um velório foi num lugar próprio, estéril, cinzento, frio, com uma sala de estar e um quarto.
Nesse caso, ao chegar e ver as pessoas dispersas pelos espaços comuns da casa, com expressões entristecidas e resignadas, senti um peso, percebi como a realidade da morte e da ausência era tangível. Fiquei assustada. No entanto, esses pensamentos e sensações desapareceram quando me aproximei do caixão.
Uma senhora de aparência frágil, com seus 90 anos, chorava a morte da irmã mais velha, sentada numa cadeira ao lado do caixão, quase pendurada nele. Após alguns segundos absorvendo a cena e a dor contida ali, senti um impulso de ir até lá. Ajoelhei-me ao lado dela, fazia anos que não nos víamos e não sei se ela me reconheceu. Isso não importa.
Ouvi muitas histórias sobre como a irmã era linda e delicada e como cuidou dela e dos irmãos quando ficaram órfãos de mãe. Abraçei, beijei e tentei oferecer palavras de conforto. Lembrei-me da falta que minhas avós e minha sogra fazem para mim. Hoje, enfrento meu luto encontrando conforto no amor. Permito que o amor que recebi e sinto continue e se expanda, falo sobre os momentos bons, ouço as pessoas falarem delas. Aqueles que partem permanecem vivos em nós; falar sobre eles, lembrá-los e manter as tradições que tinham são atitudes que os tornam eternos.
Há anos, Drummond me ensinou que “Por muito tempo achei que ausência é falta. E lastimava, ignorante, a falta. Hoje não a lastimo. Não há falta na ausência. A ausência está em mim. (…) porque a ausência, essa ausência assimilada, ninguém a rouba mais de mim.” Dessa forma, sigo enfrentando o luto, assimilando a falta e convivendo com as cores da memória e dos sentimentos reais.
Luciana Medeiros Especialista em gestão estratégica, observadora do comportamento humano e da vida
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