Alfredo Filho

O jogo da BYD no Brasil e a difícil arte de equilibrar promessas, impostos e realidade

REDAÇÃO

02/06/2025 as 4:47 pm

Olha, vou ser bem direto com você, meu caro leitor. A cena dos 7.292 veículos da BYD atracando em Itajaí pode até impressionar, mas por trás dessa manobra logística existe muito mais estratégia do que entusiasmo produtivo. Não é por acaso que esse megadesembarque aconteceu pouco antes do reajuste das alíquotas de importação. Trata-se de um movimento calculado para driblar o aumento de impostos e garantir um estoque robusto enquanto o cenário fiscal ainda permitia. Jogada inteligente? Sem dúvida. Mas aí vem o outro lado da moeda.

Enquanto a BYD movimenta navios e empilha carros em pátios brasileiros, a tão falada “fábrica” de Camaçari ainda é, na prática, um sonho vendido em coletivas de imprensa. O discurso de início de produção no fim de junho, em regime SKD, ou seja, com peças semi-desmontadas, soa muito mais como um início simbólico do que como um avanço real na industrialização. Montar kits importados não é o mesmo que fabricar. Quem entende minimamente de cadeia produtiva sabe a diferença brutal que existe entre uma coisa e outra.

Para quem acompanha o mercado automotivo, fica fácil perceber o jogo de cena. A marca ganha market share acelerado, se antecipa à alta dos impostos, enche os portos e com isso pressiona ainda mais as montadoras nacionais, que já andam tropeçando para sobreviver no atual ambiente competitivo. O resultado são montadoras nacionais sendo esmagadas por margens cada vez mais apertadas e uma rede de fornecedores sufocada.

Agora, como se não bastasse a pressão aqui, a BYD também enfrenta seus próprios fantasmas lá fora. A crise na China, com o fechamento de mais de 20 concessionárias em Shandong e clientes revoltados com serviços pagos e não entregues, expõe o risco de um crescimento rápido demais, sem bases sólidas. São sinais claros de que o império pode ser vistoso por fora, mas frágil nas estruturas internas. Afinal, volume não sustenta uma marca se o pós-venda desmorona.

A questão que fica para o Brasil é simples. Vamos permitir que esse modelo de expansão continue baseado em importação agressiva e montagem superficial? Ou vamos, de fato, cobrar transferência de tecnologia, geração de empregos qualificados e fortalecimento da cadeia produtiva nacional? Porque, sejamos sinceros, não adianta termos ruas cheias de elétricos chineses se nossas indústrias estão vazias e nossos trabalhadores, desempregados.

A grande pergunta que permanece, e deixo para a sua reflexão, é se o Brasil terá coragem política e visão estratégica para equilibrar o avanço dessa nova potência automotiva com o fortalecimento da nossa indústria. Ou vamos apenas assistir, parados, enquanto viramos vitrine de navios lotados e promessas repetidas.

Nos vemos na próxima semana. Até lá!

Alfredo Filho – Consultor de marketing automotivo, apaixonado por carros. Nos últimos dez anos de sua carreira profissional, participou do desenvolvimento de campanhas de comunicação e marketing.

Foto: istock

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