Em tempos de crise institucional e de exacerbado ativismo judicial, a presença das entidades que compõem o arcabouço democrático torna-se ainda mais necessária. Dntre elas, destaca-se a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), criada não apenas como uma autarquia corporativa, mas como um verdadeiro instrumento de defesa da cidadania, dos direitos fundamentais e do Estado Democrático de Direito.
A questão relevante a ser respondida é saber se diante das atuais tensões entre os Poderes, da expansão dos limites da jurisdição constitucional e da crescente judicialização da política: a OAB está cumprindo seu papel institucional e social?
Pois bem, a Constituição Federal de 1988 não atribuiu à OAB apenas a função de fiscalizar a atividade advocatícia. Foi além. Em seu art. 133, o texto constitucional afirma de forma categórica que “O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão.”
Esta afirmação carrega um peso institucional: o advogado não representa apenas interesses individuais, mas é peça fundamental para a preservação do devido processo legal, da ampla defesa, e, por consequência, dos direitos e garantias fundamentais previstos no Título II da Constituição.
Mais do que isso, o Estatuto da Advocacia e da OAB, estabelece como finalidade da Ordem “defender a Constituição, a ordem jurídica do Estado democrático de direito, os direitos humanos, a justiça social, e pugnar pela boa aplicação das leis, pela rápida administração da justiça e pelo aperfeiçoamento da cultura e das instituições jurídicas.”
Não se trata, portanto, de uma faculdade, mas de uma obrigação institucional da OAB diante de ataques a direitos civis, sociais e à legalidade democrática.
Contudo, à luz do momento atual, observa-se um crescente debate sobre o chamado ativismo judicial – quando juízes e tribunais, especialmente o Supremo Tribunal Federal, extrapolam seu papel técnico-interpretativo e passam a atuar como protagonistas políticos. Em um cenário em que liberdades individuais são relativizadas por decisões monocráticas e o princípio da legalidade é substituído por interpretações discricionárias, a OAB, que deveria ser uma voz firme na defesa dos direitos constitucionais, silencia ou se omite.
Em casos recentes envolvendo quebra de sigilos sem devido processo legal, prisões cautelares sem fundamentação concreta, e até restrições a liberdades de expressão e imprensa, a OAB tem adotado uma postura tímida, quando não ausente. Essa omissão tem causado incômodo dentro da própria advocacia e entre setores da sociedade civil que esperam uma atuação altiva, isenta de pressões políticas.
Assim, do ponto de vista normativo, o papel da OAB é claro e inarredável: defender os pilares do Estado de Direito, os direitos humanos, e garantir que nenhuma autoridade esteja acima da Constituição. No entanto, do ponto de vista fático, é legítimo afirmar que a OAB tem falhado parcialmente em cumprir este papel diante do atual cenário político-jurídico brasileiro.
A falta de uma atuação mais incisiva frente a decisões judiciais de duvidosa legalidade, somada ao distanciamento em pautas essenciais da democracia, expõe a entidade ao risco de perder sua credibilidade histórica e se transformar em uma instituição coadjuvante, quando deveria ser protagonista na defesa das liberdades públicas.
O momento exige coragem institucional. A história já demonstrou que o silêncio das instituições pode custar caro à democracia. Que a OAB possa reencontrar o seu papel constitucional, com a independência, altivez e compromisso que a sociedade espera dela.
Marcelo de Souza é advogado, sócio do Escritório Souza – Advocacia EmpresarialInstagram: @advmarcelodesouza2022 E-mail: contato@marcelodesouza.adv.br
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