A corrupção é fenômeno complexo que permeia a vida humana e carrega consequências negativas nas esferas individual e coletiva. Reduz a qualidade de vida; arruína carreiras e reputações; retira acesso a serviços básicos, encolhe oportunidades de emprego e viola direitos fundamentais. Ademais, desafia a democracia e o Estado de Direito ao permitir o florescimento de grupos organizados para o crime, terrorismo e outras fontes de ameaça à segurança; distorce os mercados e promove queda de confiança nos membros do governo e nas instituições. A ampla definição acima não é minha. É fruto do trabalho de observação e combate à corrupção realizado pela Transparência Internacional (Brasil) no ano de 2021. Para alguns de nós a corrupção não passa desse conceito amplo, abstrato, intangível e, por vezes, até aparentemente alheio à nossa vida cotidiana. Ainda que seja objeto de exaustiva exposição pelos portais e canais de notícias, não reverbera em nós de forma proporcional ao dano que causa. Estamos preocupados em sobreviver e, quanto a isso, nada há de errado. A indignação social com essa prática parece estar entorpecida e deu lugar a um comportamento aparentemente leniente com os atos de corrupção. Para outros, no entanto, sobretudo para os que sentiram a materialização da corrupção e experimentaram perdas irreparáveis de familiares e amigos, resta recorrer à tutela judicial “em busca da justiça que resta”. Essa expressão me foi dita por um amigo, Promotor de Justiça, num contexto de perda familiar irreparável ocorrida por conta da famigerada “lista de crianças cardiopatas” do Hospital Francisca Mendes. Sobre ela tenho meditado e quando, no exercício do meu mister, me defronto com situações análogas a que vivi, utilizo-a como bálsamo para aliviar as dores de quem fica. Vivemos, há muito anos, um caos na saúde pública deste Estado. Membros do Executivo estadual (ex-governador, secretários de saúde) e empresários foram presos pela Polícia Federal por desvios de verbas públicas destinadas à saúde, naquela que ficou conhecida como “Operação Maus Caminhos”. Mais recentemente, na Pandemia de COVID 19, outros agentes passaram a ser investigados pelo uso indevido de recursos públicos na aquisição de respiradores (que não eram respiradores), EPI’s (que não protegiam), oxigênio em volume aquém do necessário, etc. Corruptos são pródigos em criar estratégias para desviar recursos em situações de caos. Certo é que no Amazonas, em ambos os casos, crianças, adultos e idosos perderam a vida pela falta de medicamentos, pela falta de leitos; pela falta de médicos e enfermeiros; pela falta de oxigênio; enfim, pela falta de compromisso com o que é correto. Sejamos, cada um de nós, fiscais do que nos pertence para que situações assim jamais voltem a ocorrer. Se assim o fizermos não será necessário contentar-se com a “justiça que resta”. Deus nos abençoe.
Marcelo Souza é advogado, sócio do Escritório Souza e Atem – Advocacia EmpresarialE-mail: contato@souzaeatem.adv.br
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