Trair e coçar é só começar: o esporte nacional da política brasileira

03/06/2025 as 8:54 pm

Caros leitores,

Nosso editorial, como vocês bem sabem, sai sempre aos domingos. É o dia oficial de colocar a casa em ordem, olhar o Amazonas com aquele misto de espanto e resignação, e tentar traduzir o absurdo em palavras. Mas, desta vez, precisei adiantar a conversa para esta terça-feira. Culpa de um telefonema. Liguei para uma fonte — dessas que sabem muito e, não raro, falam ainda mais — para apurar outra pauta. Bastaram cinco minutos de conversa e o assunto descambou para aquilo que parece ser o tema central da política atual: a arte da traição. E aí, meus caros, não dava para esperar até o próximo domingo.

Afinal, o que se tornou a política senão um campeonato nacional de trairagem? O curioso é que não há mais constrangimento — virou técnica de sobrevivência. Colegas de ontem tornam-se adversários de hoje. Promessas de alianças duradouras evaporam antes mesmo do cafezinho esfriar. Quem manda agora não é a ideologia, é a agenda: “Quem me oferece mais nesta semana?”

Se um dia políticos discursavam sobre projetos, reformas e ideias de país, às vezes fico em dúvida. Agora, me parece que discutem apenas cargos, emendas, espaços em secretarias, indicações em estatais. E tudo isso, claro, sob o manto da “responsabilidade institucional”, como gostam de dizer com aquele ar grave, quase catedrático, enquanto acomodam a faca nas costas do aliado da véspera.

Maquiavel, esse velho consultor não remunerado de muitos políticos, já nos alertava: quem só quer ser bom, será esmagado. Mas creio que nem ele imaginaria o nível de sofisticação da política à brasileira. Aqui, o jogo é outro: o sujeito elogia o amigo na coletiva e, na mesma noite, trama sua substituição no jantar reservado. Uma dança de salão onde todos sorriem enquanto empurram os outros para fora da pista.

Não faltam, claro, os que posam de guardiões da moral enquanto praticam o manual completo da traição secular. Discurso de fé na TV, rasteira nos bastidores. Falam que amam o povo, mas os únicos que defendem são os da própria família — e, de preferência, com cargos distribuídos entre os seus.

No Amazonas, como em tantas praças do país, o teatro se repete com a mesma encenação e os mesmos figurantes — só mudam o sotaque e o cenário. Alianças se formam com o entusiasmo de casamentos arranjados e terminam com a velocidade de um divórcio litigioso.

E o eleitor, nesse samba de uma nota só? Assiste atônito, quando não anestesiado. Muitos, cansados do cinismo, sequer se dão ao trabalho de acreditar. Afinal, como pedir que levem a política a sério, se seus próprios atores parecem não levar?

Aristóteles dizia que a boa política é aquela feita em nome do bem comum. No Brasil, parece que esse bem comum anda cada vez mais… exclusivo. Como uma sala VIP à qual poucos têm acesso, mas onde todos gostariam de estar.

Enfim, cá estamos: um país de grandes urgências e pequenos políticos, onde a única fidelidade consistente é à própria carreira.

Um abraço ácido, crítico — e, ainda, não sei bem como, esperançoso.

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